terça-feira, 4 de janeiro de 2011

União acrescenta 10% do valor do Fundeb para complementar educação básica

Por Leandro Kleber e Maíra Streit

• Em 2007, a contribuição da União foi de R$ 2 bilhões, cerca de 4% do Fundeb naquele ano. Desde então, o número subiu gradativamente, conforme exigido por lei;
• Dados do IBGE (2010) revelam que Fundo colaborou para aumentar a taxa de escolarização das crianças de até cinco anos, de 23,3%, em 1999, para 38,1%, em 2009.
• Conheça mais o Fundeb e saiba como a imprensa pode fiscalizar pela internet os entes federativos que recebem a complementação.


Criado para garantir mais recursos e melhorar a qualidade de ensino da educação básica, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) completou três anos em 2010. O Fundo assegura o financiamento da educação básica de todos os entes da federação – e a União complementa os estados e municípios que não conseguem atingir o valor mínimo nacional por aluno, estabelecido este ano em R$ 1.414,85.

Conforme determina a legislação, a partir de 2010 o governo federal deverá destinar 10% do valor do Fundo a título de complementação. Em 2007, a contribuição federal estava em torno de 4% (R$ 2 bilhões). Desde então, esse número subiu gradualmente, atingindo 6% (R$ 3 bilhões) em 2008 e 7% (R$ 4,7 bilhões) em 2009. O Fundeb foi implementado em substituição ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), que vigorou de 1998 a 2006 – e destinava recursos apenas para o ensino fundamental. Já o objetivo do Fundeb é financiar toda a educação básica pública – do ensino infantil ao médio.

Mais recursos para complementação

De acordo com o Ministério da Educação (MEC), em 2006, último ano do Fundef, a complementação da União foi de pouco mais de R$ 300 milhões. A previsão de repasses da União por meio do Fundeb para 2010 é de R$ 7,6 bilhões, valor 25 vezes maior em relação a 2006.

Segundo estimativas do governo federal, a mudança ampliou o número de alunos beneficiados de 30,2 milhões para 48,1 milhões, entre 2006 e 2010. Em resumo, trata-se de um fundo bilionário, formado por recursos dos estados e municípios, além da parcela federal de 10% para a complementação. Sua operação se estende até 2020.

Só nove estados vem recebendo repasses da União por meio do Fundeb este ano, todos do Norte e Nordeste: Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Maranhão, Pará, Paraíba, Pernambuco e Piauí. Quase 1,8 mil municípios destas unidades federativas também recebem ajuda do governo central com o objetivo de colaborar para que o valor mínimo estipulado por aluno seja alcançado. O dinheiro da União relativo ao Fundo é depositado nas contas correntes dos entes federativos sem necessidade de celebração de convênios. 

Responsabilidades e monitoramento

O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), do Ministério da Educação (MEC), tem por responsabilidade acompanhar as ações de âmbito nacional e oferecer apoio técnico a instituições e pessoas físicas, além de realizar avaliações de resultados decorrentes da implantação do Fundo. Já a gestão dos recursos do Fundeb (programação, aplicação financeira, movimentação bancária, pagamentos etc) cabe ao chefe do Poder Executivo e à autoridade responsável pela Secretaria de Educação ou órgão equivalente nos Estados, Distrito Federal e Municípios.

Mobilização da sociedade civil


A pressão da sociedade civil organizada foi um dos marcos no processo de discussão e implementação do Fundo. O movimento Fundeb pra Valer! – composto por mais de 200 entidades e coordenado pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação – realizou diversas manifestações em frente ao Congresso Nacional em 2005, enviou abaixo-assinados a parlamentares e percorreu as comissões (na Câmara e no Senado) por onde o projeto passou. O objetivo do grupo era efetivar a criação de uma política pública que realmente representasse avanços. Entre outras conquistas, o movimento ajudou a garantir que as crianças de zero a seis anos fossem incluídas no repasse de verbas do Fundo.         

Ensino até 5 anos de idade: taxa de escolarização sobe de 23,3% para 28,4%

O relatório Síntese de Indicadores Sociais 2010 – Uma análise das condições de vida da população brasileira, divulgado recentemente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), reconhece a importância do Fundeb para a melhoria nas condições do ensino infantil no País. Os dados confirmam que a taxa de escolarização das crianças de até cinco anos subiu de 23,3%, em 1999, para 38,1%, em 2009. Nas áreas rurais, onde a oferta de estabelecimentos para este segmento populacional é mais reduzida, o crescimento foi também bastante significativo, passando de 15,2% para 28,4%. Segundo avaliação publicada pelo IBGE, “o FUNDEB, além de estimular o acesso das crianças à escola desde cedo, repassa verbas para os municípios investirem nos segmentos do ensino fundamental, mas com
prioridade imediata no crescimento do número de estabelecimentos e na qualidade do ensino para atender à primeira infância”. 

Reconhecimento do Fundeb

O coordenador-geral de operacionalização do Fundeb no Ministério da Educação, Vander de Oliveira Borges, acredita que a grande inovação é a inclusão socioeducacional promovida e assegurada na educação básica, “de ponta a ponta”. Segundo ele, isso por si só já justificaria a criação do Fundeb. “Há uma elevação substancial de recursos. Nós repassamos R$ 5 bilhões em dinheiro federal pelo Fundeb no ano passado. Em 2006, por exemplo, último ano de Fundef, a complementação da União foi de pouco mais de R$ 300 milhões, menos de 1% do Fundeb. Os R$ 5 bilhões representaram 7% do total do Fundeb em 2009, incluindo pagamentos de estados e municípios, no ano passado”, detalha.

A previsão de repasses da União por meio do Fundeb para 2010 é de R$ 7,6 bilhões. Apesar do aumento, Borges reconhece que a iniciativa por si só não é a solução de todos os problemas da educação e que “o País precisa melhorar a qualidade do ensino”. “O Fundo é um passo extraordinário. A gente assegura os meios financeiros, mas depende da ação dos estados e municípios, que têm nas mãos o poder de assegurar a educação básica”, ressalta.

Ele cita o caso dos estados de Maranhão e São Paulo como exemplo da diminuição das desigualdades regionais. “Analisando os dois, um rico e um pobre, observamos que quando você investe dinheiro federal, o Maranhão se destaca. São Paulo não recebe nada, porque já tem um per capita alto. No Maranhão o per capita é baixo, por isso precisa receber complementação. Fazendo isso, reduzimos a desigualdade existente entre os dois. O recurso da União eleva o valor do Maranhão e o aproxima de São Paulo, reduzindo a diferença”, explica.

O professor adjunto da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília Célio da Cunha, que também é consultor da Organização para a Educação, a Ciência e a Cultura das Nações Unidas (Unesco), avalia que o Fundeb é um dos mais importantes mecanismos da política educacional brasileira. “Isso obriga a União a complementar os estados e municípios. Os recursos são necessários para assegurar um padrão mínimo de qualidade. Além disso, o fato de favorecer a cooperação entre as redes estaduais e municipais de educação deve ser ressaltado. Ainda gera impacto no processo de luta pela valorização dos professores”, completa.

Na opinião do diretor da Diretoria de Estudos e Políticas Sociais do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Jorge Abrahão de Castro, o Fundeb ainda é uma política em desenvolvimento, mas que já propõe correções ao Fundef. Isso porque, de acordo com ele, amplia o acesso ao ensino básico como um todo. “O Fundeb é um avanço. Mantém a ideia de distribuir os recursos por aluno e reconstrói pesos entre áreas”, diz. “Estabelecer um mínimo é muito importante. Significa que você vai exigir mais do professor, ter uma escola mais de aprendizagem, porque a educação de qualidade, se for para todos, é uma forma muito concreta de combate à desigualdade regional”, analisa.

Ideb X Fundeb

 Para o economista da Transparência Municipal François Bremaeker, apesar do aumento dos repasses da União por meio do Fundeb, a verba ainda não atende à demanda brasileira, mas apenas garante o piso mínimo de recursos para nove estados. “Como atende apenas ao mínimo, não consegue garantir uma boa qualidade do ensino. Onde temos as mais baixas receitas orçamentárias municipais per capita – no Norte e Nordeste e nas periferias metropolitanas do Sul e Sudeste – é justamente onde a avaliação do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) apresenta os piores resultados”, diz.   Pouco mais de mil municípios considerados prioritários pelo MEC, com Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) baixo, não recebem complementação do Fundeb por parte da União. Isso porque como o critério do Fundeb é vinculado à arrecadação do Fundo sobre o número de alunos local, tais cidades atingem o valor mínimo necessário.

 O X da gestão

O consultor da Unesco, Célio da Cunha, acredita que algumas cidades devem ser objeto de atenção especial do Poder  Público. “E simultaneamente a essa atenção especial, precisa ser analisado se os municípios com Ideb baixo estão de fato aplicando com eficiência os recursos disponíveis. Não são poucos os municípios cuja arrecadação deveria estar permitindo um melhor desempenho na área da educação. Daí a importância de uma Lei da Responsabilidade Educacional para punir os entes que não estão cumprindo sua parte no pacto federativo”, argumenta.

O especialista em Fundeb do Ipea, Jorge Abrahão de Castro, confirma a problemática nos estados, já que os recursos aplicados poderiam trazer melhores resultados. “Na realidade, isso mostra uma grande ineficiência do gasto público. O município ou estado não está recebendo recurso da União porque os dados mostram que já se gasta acima da média nacional. Então ou o Ideb está mal calculado, ou o gestor local está usando muito recurso e tendo péssimo resultado. Alguma coisa está errada”, diz. Ele acredita que os municípios possam estar fazendo mau uso dos recursos. “Talvez um município desses demande não mais dinheiro, mas sim um acompanhamento técnico, para ver o que está ocorrendo. Às vezes é só um problema de gestão”, explica.  

Desvio de recursos


No início de setembro, as investigações da Polícia Federal (Operação Mãos Limpas), que contaram com o auxílio da Receita Federal, Controladoria Geral da União e do Banco Central, revelaram indícios de um esquema de desvio de recursos da União que eram repassados à Secretaria de Educação do Estado do Amapá, provenientes do Fundeb e do antigo Fundef. O estado do Amapá e seus municípios tiveram aporte de R$ 2,2 bilhões em recursos entre 2003 e agosto de 2010. O governador do Amapá, Pedro Paulo Dias (PP), e o ex-governador Waldez Góes (PDT) foram presos.

Controle social

A fiscalização dos recursos do Fundeb é realizada pelos Tribunais de Contas dos Estados e Municípios e, quando há recursos federais na composição do Fundo em um determinado estado, o Tribunal de Contas da União e a Controladoria-Geral da União também atuam. Trata-se de um trabalho diferente daquele realizado pelos Conselhos de Acompanhamento e Controle Social do Fundo, já que estas instâncias têm a prerrogativa legal de examinar e aplicar penalidades, na hipótese de irregularidades. O Ministério Público, mesmo não sendo uma instância de fiscalização de forma específica, tem a atribuição de zelar pelo cumprimento da lei e acompanhar eventuais denúncias.

 Pelo Orçamento Geral da União, também é possível monitorar quanto o governo central desembolsa com o Fundeb. Os dados podem ser obtidos em portais que reproduzem o Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), que disponibiliza as receitas e as despesas da União – Poder Executivo, Legislativo e Judiciário. São eles:

• Dados por município:

Siga Brasil, do Senado Federal
www9.senado.gov.br/portal/page/portal/orcamento_senado/SigaBrasil

Sistema de Monitoramento do Investimento Criança (SimIC)
http://investimentocrianca.org.br/SimIC

Secretaria do Tesouro Nacional
www.tesouro.fazenda.gov.br/estados_municipios/transferencias_constitucionais.asp

• Dados por estado:

Portal da Transparência, da Controladoria-Geral da União (CGU)
www.portaltransparencia.gov.br

Orçamento Brasil, administrado pela Câmara dos Deputados
www2.camara.gov.br/atividade-legislativa/orcamentobrasil

Publicado pela Agência de Notícias dos Direitos da Infância (ANDI), em setembro de 2010.

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